Você já deve ter percebido a diferença no seu rendimento e bem-estar depois de uma boa noite de sono em comparação com uma noite mal-dormida. Mas será que recuperar as energias é a única função do sono? E afinal, por que dormimos?
A ciência não tem uma resposta exata para essa pergunta, mas já existem pesquisas e evidências suficientes para acreditar que dormir faz bem para o cérebro e para o corpo. Além do cansaço, a falta de sono também afeta os níveis de cortisol, adrenalina, a pressão arterial e a contagem de células brancas, deixando o paciente mais suscetível a infecções.
A memória tem uma piora significativa, bem como a capacidade de se expressar e tomar decisões. Também é comum que pessoas com privação de sono fiquem mais agressivas.
Mas por que isso acontece? Acompanhe que eu já explico alguns dos processos que acontecem no nosso cérebro enquanto dormimos.
Limpeza do cérebro
Nosso sistema nervoso é habitado por células que defendem e eliminam substâncias invasoras e células mortas ou com defeito, mantendo o cérebro seguro.
Mas o que isso tem a ver com o por que nós dormimos?
Bom, é justamente durante o sono, quando nossa atividade corporal é menor, que o nosso cérebro consegue fazer essa “faxina”, descartando as células potencialmente neurotóxicas que se acumularam ao longo do dia.
Isso ocorre através de uma verdadeira “limpeza cerebral” de ondas de líquor, que é o líquido cérebro-espinhal, através do “sistema glinfático”. Eles percorrem o cérebro eliminando as substâncias tóxicas para que elas não se acumulem entre a massa cinzenta.
Quando dormimos mal (ou não dormimos), todo esse trabalho fica comprometido, acarretando em consequências bastante negativas no futuro. Há indícios de que falhas nesse mecanismo podem influenciar no desenvolvimento de déficit cognitivo, demência e Alzheimer.
Consolidação de memórias e aprendizado
Nosso cérebro é ótimo para guardar memórias, mas ainda melhor em esquecer. E isso faz parte do processo de aprendizagem, consolidação de memórias e regulação das emoções.
Existe uma teoria, chamada de hipótese da homeostase sináptica (SHY), de que o cérebro apaga algumas memórias enquanto dormimos.
Se você já viu o filme “Divertida Mente”, da Pixar, vai lembrar de uma cena em que os trabalhadores da mente passam pelas estantes de lembranças com uma máquina, escolhendo o que manter e o que mandar para o lixão, para serem permanentemente esquecidas.
Segundo essa teoria, o cérebro percebe quais memórias são mais fortes (que são as que têm muitas ligações com outras, mais antigas) e escolhe as mais fracas para serem “deletadas”.
Isso explica porque esquecemos de algumas coisas pouco importantes (como a roupa que usamos em uma determinada ocasião), mas lembramos de outras que são relevantes (como um número de celular ou o rosto de uma pessoa querida).
Regulação hormonal
Outra razão importante pela qual dormimos é a regulação dos hormônios.
Produzidos pelas nossas glândulas, os hormônios são substâncias químicas que controlam diversas funções do nosso corpo, como o crescimento, a vida sexual e o processo metabólico.
Estudos já mostraram que dormir pouco pode desregular a produção hormonal, impactando em todo nosso metabolismo e funcionamento do organismo. Ao interferir na liberação de substâncias importantes como o cortisol, a testosterona, hormônios do crescimento, a tiroxina, substâncias que controlam a fome e saciedade como a grelina e leptina, e o próprio hormônio do sono, a melatonina.
Esse último caso está diretamente relacionado ao ritmo circadiano, um ciclo com cerca de 24 horas que se repete a cada novo dia, regendo vários mecanismos biológicos como o horário de liberação de hormônios e o sono. É o famoso “relógio biológico”.
Como o cérebro recebe estímulos diferentes durante o dia e a noite, o ciclo circadiano regula, de acordo com o horário, as principais atividades e processos biológicos que acontecem no nosso corpo.
A melatonina é produzida durante a noite, quando não há luz externa, para induzir o sono e sinalizar que está na hora de descansar. Acontece que, hoje, nós temos muitos recursos que podem acabar “enganando” o cérebro, como a iluminação artificial e a luz de telas de celulares, que fazem a mente ficar mais desperta.
Com isso, a produção de melatonina é inibida e o sono fica prejudicado.
Prevenção de doenças
Ter uma boa qualidade do sono também é importantíssimo para prevenir diversas doenças. Isso porque dormir bem está diretamente relacionado a ter um sistema imunológico fortalecido.
Nós já vimos que, durante o sono, o cérebro regula sua produção hormonal, o que interfere no metabolismo da glicose e no acúmulo de gordura corporal, por exemplo.
Da mesma forma, é no período do descanso que o corpo produz substâncias como anticorpos e citocinas, fundamentais para proteger o nosso organismo de invasores. Há estudos mostrando, inclusive, a importância de uma boa noite de sono após a vacinação, para que ela induza mais fortemente a produção de anticorpos e seja mais efetiva.
E, ainda relacionado aos hormônios, quando um paciente dorme pouco ou mal, ele acaba tendo uma liberação maior de cortisol, o chamado hormônio do estresse. Com isso, a reação das células de defesa diminui, deixando-o mais suscetível a infecções e doenças.
Longevidade
Com tantos processos acontecendo no nosso corpo durante o sono, fica bastante claro por que dormimos e a importância desse período de descanso para a nossa saúde e bem-estar.
Ele é tão importante quanto uma alimentação saudável, a prática regular de atividade física, o controle do estresse e a busca por hábitos de vida saudáveis.
Quem tem problemas para dormir pode não só estar sentindo fadiga, falta de energia e diminuição no rendimento no trabalho, mas também prejudicando seu próprio organismo em níveis preocupantes.
As consequências das noites mal-dormidas podem prejudicar:
- a saúde física (causando doenças como Alzheimer, diabetes e problemas cardiovasculares),
- a saúde mental (aumentando condições como a depressão e a ansiedade).
Se dormir não fosse tão importante, dedicar um terço do tempo de vida ao sono seria o maior erro da evolução humana.
O cientista inglês e professor de neurociência e psicologia Matthew Walker tem um livro chamado “Por Que Dormimos”, que pode ser sintetizado em uma frase: “quanto menos você dorme, menos você vive”.
Por isso, não deixe de cuidar da saúde do seu sono! Se precisar de ajuda nessa jornada, conte comigo!
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